Texto mais que crítico - abigail Campos Leal
- Thiago Costa
- 1 de mai.
- 4 min de leitura
abigail Campos Leal
Escritora, pesquisadora
Texto escrito para exposição
Igbaki ou o Assentamento da anunciação
na Caixa Cultural em São Paulo
será que o fogo azul também queima a pele de Thiago Costa quando o ferro fundido amansa nossa paisagem? será que as formas que suas esculturas tomam são também um tipo dança, cujo movimento é inspirado em poses estelares? a Física Quântica nos diz que no toque acontece um gingado imprevisível onde algo de umpassa praoutra. umssa pratra. emanharamento quântico. a possibilidade de duas partículas distintas, impossivelmente distantes, serem a mesma coisa por terem estado em contato em algum momento do espaçotempo. então, eu poderia dizer que sim, desde que sentíssemos, de antemão, que a pele de Thiago Costa já se transmutou em ferro há muito
em Igbaki somos convidadas a dançar o gesto da escuridão. imagine que sua cabeça é uma câmera de filmagem y quando você olha Cobra de Duas Cabeças (Costa,2023), movendo-se circularmente de um lado para outro, depois subindo y abaixando a cabeça enquanto circula, imagine que nesse instante é Cobra de Duas Cabeças que se mexe. essa dança é também o movimento do som, pois os movimentos circulares y semi-circulares das obras de Costa é também um sinal de que essa escrita está emaranhada com as ondas sonoras. Igbaki nos convida a perceber as esculturas forjadas no magma fértil da ancestralidade afro-diaspórica como um tipo de composição musical. essas esculturas são ondas sônicas que viajaram a infinitude cósmica y tomaram outra forma quando atravessaram a pele ferruginosa de Costa. elas podem ser não apenas as próprias ondas, mas o idioma imagético da sua transcrição. Igbaki poderia ser, então, uma grande partitura espalhada entre chão y parede, cravada y voante
suas obras são muito serenas, apesar de todo o peso obscuro que invariavelmente carregam. as suas articulações são aéreas, como se o seu trabalho fosse precisamente soprá-las diante de nós, = como se ele as retorcessem contra o vento suave que sai de sua boca. então, talvez Thiago Costa seja uma espécie de flautista, soprando essas formas y inscrevendo-as em outra geografia. talvez, foi no fundo de um quarto escuro sem ninguém a não ser seus ancestrais, que ele ouviu pela primeira vez o som do ferro dobrando no fogo do infinito
as esculturas de Thiago costa também são poesia, primeiramente porque ele nos lembra no seu fazer que a palavra é matéria. a sua relação com a palavra poética é inegável, y não tenham dúvida, ele a trabalha como um ferreiro, como um ourives. aqui penso tanto em Obé Poesias y Orikis (Costa, 2020) quanto em Estudos Para Obés (Costa, 2023), mas penso sobretudo no desenho que a terra faz quando nossa pele ferreia em profusão. por isso ele corta y funde as palavras, por isso ele dança y declama o ferro. porque todo esse texto, toda essa narrativa, não chega antes da beleza. a beleza dos movimentos, das formas, da oxidação, das variações de cores ferrosas, das formas exatas que quando olhamos mais de perto enxergamos que carregam a inexatidão de todos os mundos. a beleza chega primeiramente como oferenda
a tumba é um lugar de passagem
a quem servem os faróis?
ENGLISH VERSION
MORE THAN A CRITICAL TEXT
Abigail Campos Leal
PhD, writer, and researcher
Text written for the exhibition
Does the blue fire also burn Thiago Costa’s skin when cast iron softens our landscape? Are the shapes his sculptures take also a kind of dance, whose movement is inspired by stellar poses? Quantum Physics tells us that in touch there is an unpredictable sway, where something from one passes into the other. A silver thread. Quantum entanglement. The possibility that two distinct, impossibly distant particles might be the same thing, having once touched somewhere in space-time. Then I could say yes—so long as we feel, beforehand, that Thiago Costa’s skin had already transmuted into iron long ago. In Igbaki, we are invited to dance the gesture of darkness. Imagine your head is a camera, and as you look at Two-Headed Snake (Costa, 2023), moving in a circular motion from side to side, then raising and lowering your head as you turn, imagine that in this moment, it is Two-Headed Snake that is moving. This dance is also the movement of sound, for the circular and semicircular motions of Costa’s works are also a sign that this writing is entangled with sound waves. Igbaki invites us to perceive these sculptures—forged in the fertile magma of Afro-diasporic ancestry—as a kind of musical composition. These sculptures are sonic waves that traveled through cosmic infinity and took on a new form as they passed through Costa’s iron-hued skin. They might be not only the waves themselves, but also the imagetic language of their transcription. Igbaki could then be seen as a great score, scattered between floor and wall, grounded and airborne. His works are serene, despite the dark weight they inevitably carry. Their joints are aerial, as if his role were precisely to blow them into existence before us—as if he twisted them against the soft wind from his mouth. So perhaps Thiago Costa is a kind of flutist, blowing these shapes into being and inscribing them into another geography. Perhaps, deep in a dark room, with no one there but his ancestors, he first heard the sound of iron bending in the fire of the infinite. Thiago Costa’s sculptures are also poetry—firstly because he reminds us through his practice that words are matter. His relationship with poetic language is undeniable, and without a doubt, he works it like a blacksmith, like a goldsmith. I think here of Obé Poesias y Orikis (Costa, 2020) and Studies for Obés (Costa, 2023), but above all I think of the drawing the earth makes when our skin forges in profusion. That’s why he cuts and melts words. That’s why he dances and recites the iron. Because all this text, all this narrative, never comes before beauty. The beauty of movement, of form, of oxidation, of the variations in ferrous colors, of the exact shapes that—when we look closer—reveal they carry the inexactness of all worlds. Beauty arrives first, as an offering.
The tomb is a place of passage Who do lighthouses serve?
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